Com gente chata faz-se igual à baleia: mergulha gostoso e não se está nem aí...
O patrulhamento atual, esse
“chatissimamente correto” está um saco. Pessoas vivem vigiando o que as outras
falam, escrevem, pensam. Não se pode mais ter opinião. O sujeito cisma de
querer ser seu “amigo” (só rindo...) no Facebox, você não pediu nem convidou,
apenas “aceitou”, e qualquer coisinha mais estranha que você fale pronto. Vem o
mala alegando que o seu discurso é “desrespeitoso” ou ofensivo. Quando se fala
em certas áreas, ainda que totalmente em tese, sem indicar ou sugerir ninguém,
alguém pula da última fileira e patrulha o texto, alegando mágoa e “ensinando” que
não se pode falar o que quer. Será que não se pode, no “seu” espaço? Lidemos
com alguns exemplos famosos de liberdade de expressão para tentar melhorar o
nível. Há menos de um mês publiquei aqui na coluna algo semelhante sob o título
Ofendíveis.
O grande Gilberto Freyre, Casa
grande & senzala, 4ª ed., 1943, 1º v., p. 90, se refere ao então ditado
popular da época; “Branca para casar, mulata para f...., negra para trabalhar”.
Quem lê a frase solta pode “estranhar”, mas o contexto é bastante sedutor. Uma
coisa é o que está dito. Outra é o contexto em que o dito está. Uma pessoa mal
intencionada detratará a frase, rápido, fácil. Uma honesta procurará, inteligentemente,
o contexto. Estas últimas são, infinitamente, as melhores.
Isaac Asimov, Antologias,
1, p. 199, sobre a densidade de discurso que só busque agradar dispara:
“Qualquer acréscimo de tempero ou substância ofenderá a alguém e ocasionará
perdas. Resulta daí uma papa insossa, não porque ela agrade, mas porque não
corre o risco de desagradar.” E sobre os intelectuais da publicidade se
preocupar com isso “deve lhes provocar gargalhadas de desprezo”. Repare que o
“tempero” e a “substância” aparecem como geradores de “ofensa”, ou seja, tudo
precisa ser levinho, superficial. Haverá quem opte por um discurso-papa-insossa,
o que não será o caso, por exemplo, de um filósofo como Alain Touraine que ensina:
De novo, cito o filósofo Lou
Marinoff, Mais Platão, menos prozac, pág. 70: “As pessoas que procuram
se ofender sempre encontram motivo para isso; consequentemente, são elas que
têm um problema.” Em épocas assim, rolando solto o preconceito, o ato de pensar
- não sendo a “papa insossa” de Asimov -, como um agitador de Touraine está
ficando ridiculamente perigoso. Voltaire já ensinava: “o segredo de aborrecer é
dizer tudo.” Mas será que da época de Voltaire, que precisou fugir duas vezes
da França por perseguições à sua intelectualidade deliciosamente debochada,
nada mudou? Pois é, a goma do formalismo está escondendo navalhas para serem
usadas como vinganças, mesmo entre “amigos”.
“Triste época! É mais fácil
desintegrar um átomo do que um preconceito”, já disparava o agora eleito
cientista do século Albert Einstein, cansado de tanta interpretação maldosa e
errada a seu respeito. A minha bonita Roberta outro dia copiou de algum lugar e
postou no Facebox dela uma brincadeira sobre religião. Bastou isso para uma
amiga de infância pular e acusar a bobajada do “desrespeito”. O entrevero durou
3 minutos e a “amiga” encerrou a amizade. De amizade isso tem “pouco”. O mesmo
consumismo boçal que está fazendo filhos matarem pais, e esposas esquartejarem
maridos, está causando esses faniquitos e pitis.
Falar em tese não é nem
juridicamente ilícito, nem moralmente reprovável nem inteligentemente feio.
Agora, para pessoas “burrinhas” (sei que não posso falar essa palavra sem ser
no diminutivo, os chatos pulam) qualquer coisa será um pé para considerarem um
“desrespeito”. A sorte é que há pessoas muito mais inteligentes e geniais que
nós para nos dar colo. E um colo é uma delícia. Mesmo um colo devasso de um
intelectual que nos xingue à vontade, mas honestamente, e não nos patrulhe de
uma forma safada. É por isso que Michael Ghiselin dispara: “Arranhe um
altruísta e verá um hipócrita sangrar”.
O patrulhamento, o cerceamento,
a vigilância temática são formas hipócritas de se tentar calar o discurso “em
tese” sobre um assunto. São, essas mazelas, atreladas a alguma moral de plantão
e à suposição de que se pode fiscalizar a opinião do outro. Essa grosseria ou
autoritarismo filosóficos não deveriam ter mais vida em pleno século 21. Quem “se
sentir” difamado por qualquer coisa que contrate um advogado. Se for um
problema de “mágoa”, pode cancelar a amizade. Se for um contorno psicanalítico,
como referido por Marinoff, que procure um divã. David Levy e Helena Masseo de
Castro são grandes profissionais de divã. Está feita a recomendação e assunto
encerrado. Jean Menezes de Aguiar.
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