Certos
temas em áreas, para os quais o estudo denso, sério e científico é presumivelmente
escasso, veem-se comprometidos. Com a moda de “executivos” do direito
(antigamente eram advogados, hoje são “operadores”, terminologia mais próxima a
pregão de Bolsa, algo mais “dinâmico”, ou endinheirado) a coisa está
problemática. Não leem, esses, mais livros de Pontes de Miranda, Caio Mário,
Miguel Reale e outros tantos, só manuais, folders, apostilas, cases,
resumos, estudos de casos, mapas de brainstormings e literatura de aeroporto - a literatura como -, livros que
começam com a palavra “como” (Como ficar milionário em 12 meses; como trair o
seu chefe sem ele perceber; Como anunciar que se importa com o consumidor e
enganá-lo impunemente etc.).
Manejos epistemológicos (só rindo...), metodológicos, racionalistas, lógicos, inferenciais, filosóficos e inteligenciais superiores ficaram efetivamente postergados para o nunca. Ziraldo vai afirmar, para vingança dos superiores (não se assuste, tema efetivamente...), que somente 5% da população são geniais. Melhor não dizer o que serão os outros 95.
Manejos epistemológicos (só rindo...), metodológicos, racionalistas, lógicos, inferenciais, filosóficos e inteligenciais superiores ficaram efetivamente postergados para o nunca. Ziraldo vai afirmar, para vingança dos superiores (não se assuste, tema efetivamente...), que somente 5% da população são geniais. Melhor não dizer o que serão os outros 95.
Em
São Paulo há um modismo forense que parece ter se difundido para o resto do
país: advogados pensarem, sofrerem, se preocuparem ou quererem
prequestionamento desde a petição inicial. É das coisas mais absurdas
que já ouvi falar, mas há isso em muitos lugares “bonitos”. O prequestionamento
é uma condição pertencente ao juízo de admissibilidade do recurso
extraordinário (não torça a cara, quem o ensina é ninguém menos que Alfredo
Buzaid, ainda que “jovens” e modais processualistas discrepem) e igualmente do
especial. Pois bem, estes recursos só “existirão” se (“se” costuma ser uma
condicionante) o sujeito sucumbir em segunda instância e cismar de ir à BSB com
seus recursos. Precisará passar pelo prequestionamento.
Já
perguntei em sala de aula de pós-graduação o que é (sim, isso mesmo, verbo ser)
prequestionamento. Entrei pelo cano muitas vezes. Um conceito mesmo não veio.
Chego a tentar algumas diferenças entre prequestionar
(verbo) e prequestionamento (substantivo
derivado de verbo = ação ou efeito de prequestionar). Sugiro que pode haver
nítidas diferenças. Digo do primeiro conceito:
Prequestionar (verbo), então, poderá
ser duas coisas: 1) a atitude de requerer
da parte visando à correção de um erro decisório, em regra uma omissão,
quando, por exemplo, opõe embargos de declaração do acórdão (nunca de sentença
monocrática) visando aclará-lo; e 2) a também atitude de fazer inserir do desembargador (no mínimo, jamais juiz
de primeiro grau) na decisão, de forma expressa, a solução, o debate ou a
discussão das questões que lhe cabem resolver no sentido de não deixar perdurar
qualquer defeito, por todos a omissão.
E seu correlato:
Prequestionamento no sentido de sua existência
– há prequestionamento na decisão, ou
a decisão contém prequestionamento – não
é uma atitude em si, mas o efeito dela, a situação ou fato verificado na
decisão (o objeto da verificação, o quê
encontrado na decisão que esclarece, tira a omissão) de ausência de erro.
Mas o que é interessante mesmo é se analisar a
cepa quase que viral de teimosia de alguns profissionais que cismam em exercer ou
praticar o que entendem por prequestionamento antes de o momento eclodidor da
própria verficabilidade da existência do prequestionamento: o acórdão.
Como imaginam alguns poder “prequestionar” antes de
saber se precisam prequestionar? Inacreditável. Vou tomar apenas dois
autores maravilhosos como base para me ajudar a demonstrar essa tragédia brazuca. Araken de Assis e Fredie Didier
Jr. Vamos a eles com alguns rápidos comentários:
“E
aqui se mostra claramente quão equivocada é a concepção do
prequestionamento como ato prévio da parte; se assim o fosse,
jamais o terceiro poderia interpor esses recursos, por não ter
“prequestionado”, pela simples circunstâncias de que, até aquele momento, não
participava do feito.” (Fredie Didier jr., p. 278-9).
Comentário:
é totalmente lógica a afirmação-lição de Didier, dando um xeque mate na
questão. Fica claro que prequestionamento não é, jamais, o tal ato “prévio” da
parte, se não o terceiro que não agiu com nenhuma previedade, não poderia
utilizar como terceiro o recurso extraordinário. Claro, preciso e lógico, ainda
que para teimosos de plantão, a lógica possa ser imprestável. Se não é prévio,
o que se dirá de se preocupar com prequestionamento desde a petição inicial?
Teimosia. Nada mais que isso.
“Em
tema de prequestionamento, o que deve ser exigido é apenas que a questão
haja sido posta na instância ordinária. Se isto ocorreu, tem-se a figura do
prequestionamento implícito, que é o quanto basta” (STJ, Resp, 2ª
T, 1990, Carlos Veloso)
Comentários:
posta no sentido de inserida no acórdão, decidida, ventilada ou seja lá que
nome se dê a isso. Não é posta “na petição” do advogado. Posta no sentido de
anterioridade ao recurso extraordinário, precisa ter sido enfrentada no
acórdão.
“Há prequestionamento
implícito quando o tribunal de origem, apesar de se pronunciar explicitamente
sobre questão a federal controvertida, não menciona
explicitamente o texto ou o número do dispositivo
legal tido como afrontado. Exatamente nesse sentido o prequestionamento
implícito vem sendo admitido pelo STJ. O que importa é a efetiva
manifestação judicial - causa decidida. Não há aqui qualquer
problema: se alguma questão fora julgada, mesmo que não seja
mencionada a regra da lei a que alguma questão fora julgada, mesmo que não seja
mencionada a regra da lei a que está sujeita, é óbvio que se
trata de matéria questionada e isso é o quanto basta.”
Comentários:
aqui o autor aborda exemplarmente a bobagem do prequestionamento com
numerologia ou sabe-se lá que diabo possa ser isso, a praga do artigo de lei
que orna a cabeça de alguns formalistas.
“Turvou
a clareza do tema a deletéria influência da própria palavra
“prequestionamento”... sugerindo a todos os espíritos que prequestionar é
questionar antes. Essa semântica vulgar há que
ceder passo às proposições normativas.” (Araken de Assis, Manual, p. 702-3)
Comentários:
deletéria mesmo. Prequestionar não é questionar antes. Há que se
estudar mais. Perfeito Araken de Assis.
“O
prequestionamento constitui o próprio conteúdo do pronunciamento judicial...
Em contrapartida, o prequestionamento não se subordina, absolutamente,
à iniciativa das partes.” (Araken, p. 702).
Comentários:
disse tudo, mais uma vez. Prequestionamento nasce no acórdão, nasce ali.
Precisa se esperar o acórdão para ver se há omissão. Se não houver a matéria ou
questão está naturalmente prequestionada (pelo desembargador que fez seu
trabalho corretamente).
“Toda
e qualquer matéria de ordem pública (por exemplo, os requisitos
de admissibilidade dos recursos “ordinários”) reclama pronunciamento
explícito, e, portanto, de “prequestionamento”, para ensejar recurso - no caso,
o especial, porque se cuidará de questão federal.” (Araken, p. 703)
Comentários:
matéria de ordem pública não pode ser objeto de omissão, nem ela nem qualquer um
dos pedidos, aqui tratado de questão ou matéria, o objeto do processo.
“À
afloração dos tipos criados na Constituição basta que questão constitucional
haja sido individualizada no pronunciamento
impugnado.” (Araken, p. 703).
Comentários:
que interessante isso, individualização epistemológica da questão no acórdão
quer dizer prequestionamento, perfeito. Melhor será individualização com
conteúdo decisório pertinente, mas é interessante como o autor atribui à
epistemologia da individualização a natureza jurídica de prequestionamento.
“Individualizada a questão constitucional, e, portanto, ocorrendo prequestionamento claro e inequívoco, representará demasia a exigência da explícita indicação do dispositivo constitucional no provimento.” (Araken, p. 703).
Comentários:
de novo, ocorre prequestionamento pela tão-somente individualização da questão,
sinal de que quererá ela dizer que individualizar é ventilar ou tratar, motes
do prequestionamento, com a atenção ao “entendimento” do tema pelo STJ que aí
exige decisoriedade sobre a questão, diferente do Supremo.
“Nenhum
motivo prático ou técnico depõe contra a condescendente explicitação desta ou
daquela regra legal ou constitucional, idêntica ou diferente daquela invocada
pelas partes, que, no alvitre do órgão a quo, ampara e subsidia suas
conclusões. No entanto, o chamado prequestionamento numérico é supérfluo.
Não se confunde com essa exorbitante exigência a de o recorrente
indicar precisamente, na petição do extraordinário, a regra
ou o princípio constitucional supostamente violado no julgado. Foi o que
decidiu a 1ª Turma do STF.” (Araken, p. 704).
Comentários:
de novo a coisa da numerologia, para positivistas de plantão que acham que
fundamentar é ter um bom artigo de lei. A exigência de artigo
de lei vê-se no autor, é exorbitante e supérflua. Muito bom.
“Importa
apenas a existência de decisão, no julgado
recorrido, a respeito da questão constitucional.” (Araken, p. 704).
Comentários:
isso mesmo, prequestionamento “é” existência de decisão, quantum
decisório sobre a questão. Se esse quantum houver, há prequestionamento.
“Também
se mostra impróprio designar de prequestionamento implícito a
eventual ausência de indicação numérica do dispositivo.” (Araken,
p. 704).
Comentários: a pá de cal no tema.
Este
texto foi feito rapidamente sem qualquer rigor científico. Claro que a inserção desses dois grandes autores ilumina
qualquer texto. Poderei mexer nele mais para frente. Abraços gerais e amor no
coração. Não me levem a sério, mas levem o prequestionamento a sério. Sem revisão
ainda. Jean Menezes de Aguiar.