quarta-feira, 28 de novembro de 2012

Ex-amor

Eles voltam depois.

 Artigo publicado nos jornais O DIA SP e O ANÁPOLIS (GO) - 29.nov.2012

                Há um chavão por aí, bem comum, no sentido de que ex-amor é carta fora do baralho. Alguns, mais “violentos” chegam a assassiná-lo: chamam-no de “falecido”. Será? Como clichê, pode até impressionar. Mas a vida mostra situações bem diversas. Ulysses Guimarães que o diga. Após anos separado de sua Mora, acabou literalmente seus dias com ela, no trágico acidente. Inclusive certa vez respondeu a uma indagação da companheira dizendo que o amor máximo de um homem por uma mulher é morrer junto, quando ela se vai. O fatídico acidente se incumbiu da triste poesia.

                O que nos faz ser “humanos”? Aperfeiçoar instrumentos; identificar a tragédia; enterrar nossos mortos. Há diversas teorias. Mas a forma do amor que “inventamos” ao curso da evolução pode ser uma delas.  Aí entra o reapaixonar-se. Muitos o inadmitem, outros vivem a ideia.

Se a volta parece impossível para uns, não se pode achar que o seja para o resto da humanidade. Quando se fala em ex-amor, não se fala em ex-peguete, ex-ficante. Ex-amor é aquela pessoa que deu sonhos, planos e olhares de entrega. É claro que ex-ficantes podem voltar e até produzir amor, em outra época. Tudo é possível. Querer que “tudo” não seja possível é um defeito da maturidade.

                Também, a volta é legítima. Não se pode “julgar” alguém porque voltou com um ex-amor. Com a maioridade, que presume “juízo” nas pessoas, a própria vida é decidida por cada um. Sempre haverá bobalhões de 20 ou 30 anos obedecendo papai & mamãe. Mas isso não conta. Também haverá culturas atrasadas e religiões fundamentalistas que tentam domesticar o amor e adestrar o interesse do jovem. Quanta violência.

Com o espetacular livre arbítrio, esse traço maravilhoso da humanidade, relações amorosas podem ser retomadas desde que se decida assim, e ponto final. Há pesquisas mostrando que quando um casal volta, de verdade, o grau de separação posterior é ínfimo. Parece que voltar pode não ser o bicho papão ou uma burrice que muitos dizem ser.

                É claro que poderá haver voltas burras e trôpegas; sem o sonho do amor. Poderá haver também voltas arranjadas e convenientes. As voltas trôpegas, envolvendo o emocional, têm tudo para não dar certo. Já as voltas arranjadas, entre pessoas inteligentes que negociam com carinho e amizade uma situação de conforto mútuo podem dar certo, ainda que sem, aí, a tirania do amor. Exigir a “pureza” do amor como legitimador da relação pode ser um conservadorismo. Não poucos casamentos “de véu e grinalda” em altares elegantes mostram-se, visivelmente sem o grande amor. Uns andam, outros desandam.

                Às vezes um grande rompimento, por meses ou anos, serve como cura. Entram novas pessoas por direito e isto sereniza ciúmes e inseguranças. É como se ambos fossem equiparados a novos parceiros. Esta visão requer pessoas lúcidas e inteligentes, com boa-fé e amizade. Mas em muitos casos funciona.

                O fato é que certos desenhos da vida não são feitos pela mão do homem, mas exclusivamente pelo destino. Doenças, acidentes, perdas, mudanças etc. A vida dá voltas, algumas desconcertantes e não se estar preparado para elas, aí sim é alguma falta de maturidade. Ex-amores também se apaixonam por outrem e se vão de vez. O destino prega peças.

Numa relação de volta, a boa-fé, a amizade e a franqueza amorosas parecem ser, no mínimo, o grande dínamo de força e energia para o sucesso. Sucesso aí será uma relação na qual uma mínima harmonia gostosa de se viver impere e gere alguma felicidade.

Filósofos da atualidade como Roland Jaccard (Entrevistas do Le Monde – O indivíduo, p. 7),  mostram que “O homem da época moderna, quando não é esquizofrênico, é basicamente esquizoide.” Utiliza palavras-chaves como “solidão, tédio, melancolia e desgosto”. Também, paradoxalmente, paramos de nos comunicar “verdadeiramente” com o próximo-aqui. Pessoas no bar, por exemplo, não conversam entre si, mantêm relações secretíssimas no celular. Impera esta modalidade gritante de falta de educação. É como se o amigo “aqui” já estivesse “faturado”; vou tentar faturar o que está distante. Essa gula consumista criou novas formas de “ficar”, namorar, viver e sentir. Criou também novas formas de voltar. Descarta-se o amor com muito mais facilidade em troca de um projeto até híbrido, para esta noite, este final de semana, ou até o Carnaval. É a sociedade do desespero.

Com a invenção da solidão em massa, disfarçada em bares de pegação instantânea, talvez o ex-amor possa ser uma “garantia” de bom convívio. O defeito já conhecido do outro pode passar a ser “bonito” se cuidado de uma forma mais afetuosa ou diferente. A intimidade gera beleza. Mas só o tempo pode mostra que cara terá essa volta; se é de verdade ou não. O cinema já cansou de mostrar voltas, de todos os jeitos. A volta é uma realidade, pode ser algo muito inteligente, se manejada com sinceridade e carinho.

Isto não quer dizer que a vida não deva “andar”; a expressão popular de a “fila anda”. Separações, como tudo, devem ser vividas naturalmente, sem artificialismos. Dores também são para serem sentidas e racionalizadas de frente. Uma coisa que não adianta aí são fingimentos, escapismos ou disfarces. Se houver um novo amor ou novo interesse que se viva intensamente. Se não houver, que se viva o hiato com amigos queridos e agarrados. O colo é poderoso. Mas se houver a cogitação da volta, se for razoável, verdadeira e o coração quiser, não há o menor problema e os mesmos amigos devem ter a sensibilidade de orientar com harmonia.

                Como já diziam Aldacir Louro, Aloísio Marins e José Macedo, autores da marchinha de carnaval de 1957, “Recordar é viver, eu ontem sonhei com você”. Na teoria da volta, se a pessoa sonhar, pode estar diante de um “novo” amor, e a volta pode ser um grande e belo presente do destino. Jean Menezes de Aguiar