Algumas religiões, ou “igrejas” abusam de falar em duas coisas: a primeira é Deus. Falam como se tivessem total intimidade com o sujeito, ou com a força, conforme Spinoza e Einstein se referem. Falam como se soubessem o que ele quer, quais são os seus critérios para perdoar, seu método; como age, onde vai estar, o que gosta, o que pensa. É uma situação totalmente esquizoide e lunática. Como um primata melhorado de nós tem a arrogância de saber os hábitos e gostos de Deus? Essa gente não se contenta em querer conhecer difíceis ciências, se arroga autoritariamente a querer saber logo de Deus. Parece piada.
A segunda coisa é o uso da palavra “amor”. Fundamentalistas propagam o amor de dar inveja ao poeta, ou de emputecê-lo. É amor a deus, ao próximo, ao irmão, sobrinho, cunhado, sogra, vizinho, dono da padaria que enche o pão de bromato de potássio, ao inimigo etc. Querem que todos amem todos, pelo menos esse é o “discurso”. Mas será que esse amor existente em frases chupadas de textos religiosos é mesmo verdadeiro? Será que eles próprios amam assim ou são preconceituosos, discriminadores, separatistas e autoritários? A questão não é tão simples e os indicadores do fundamentalismo religioso mostra uma outra leitura desses convencedores de público. Aqui a raiz do texto, o amor.
O maravilhoso sociólogo Roland Barthes em acurada crítica mostra que na sociedade [consumista] o amor sai de cena, ou de moda, e dá lugar ao sexo, nada mais que isso, ficando o amor como sinal de “doença”, e o sexo como sinal de “saúde”. Há muitos que dizem: - amor? Tô fechado pra balanço, só quero diversão. É como se o amor passasse a ser um problema. Também, na sociedade do “ficar”, em que uma das moda é meninas beijarem meninas, outra é meninas beijarem vários sujeitos numa “baladinha”, ou outra ainda é todo mundo “ficar” com todo mundo apenas porque “estava” ali, isso quando não se vai para o motel para trocar o óleo, o que não há aí é amor. É claro que essas práticas carnalmente consumistas mostrariam um tipo de amor, se houvesse qualquer amor aí, mas como não há nenhum, fica nítida a situação do consumo de gente na sociedade atual. E esse consumo é puramente estético, olfativo, paladarista e atrativo. "Fica-se" porque o outro é bonito, cheiroso, tem um gosto bom e é atraente.
O consumismo da sociedade é um fato e, aí, ela consome ódio, mas consome em doses garrafais, principalmente essa que vive jurando amor. Jura por Deus que não tem "ódio no coração", fala, promete, afirma, jamais reconhece em público ter, mas exerce pesada discriminação, baba preconceito e age separatistamente. Pise no calo de um desses e verá o ódio rácico, étnico e pesado ser produzido imediatamente. Ouse ser diferente ou contestar suas crenças e verá o olhar de nojo e repugnância, jamais haverá nessa situação uma conversa solta e profunda em que questões seriam debatidas e exauridas sem guerras. Onde estaria o amor aí? Amor, vale muito para levantar bandeiras, não para se viver efetivamente com os contrários. Se não é um dos "meus", eu lhe odeio profundamente.
Um exemplo bastante nítido, sabido e público é o rechaço até violento e agressivo em alguns casos de evangélicos para com espíritas. Ambos lidam com Jesus, mas parece que os evangélicos querem que o seu Jesus seja “especial” ou verdadeiro. E aos outros apõem rapidamente a figura do Diabo para estigmatizá-los. Há amor aí?
Um exemplo bastante nítido, sabido e público é o rechaço até violento e agressivo em alguns casos de evangélicos para com espíritas. Ambos lidam com Jesus, mas parece que os evangélicos querem que o seu Jesus seja “especial” ou verdadeiro. E aos outros apõem rapidamente a figura do Diabo para estigmatizá-los. Há amor aí?
Ortodoxos judeus daquele país religioso e institucionalmente preconceituoso que é Israel (há que se ler Shlomo Sand!) têm agredido, inacreditavelmente, meninas de 8 anos de idade nas ruas e cuspido em suas caras porque elas não querem se fantasiar de sofredoras com aquelas roupas pretas horripilantes dos fundamentalistas. Há amor aí?
O mesmo consumismo que vitima a sociedade, entra igualmente na convivência religiosa, ou será que muitos dos que pregam amor não se excitam num comercialmente libidinoso shopping center? Nada contra umas “comprinhas”, diriam as suecas-brazucas com seus amarelíssimos cabelos. Assim, não se pode dizer que os “religiosos” sejam “imunes” às ondas sociológicas atuais, entre elas o consumismo (aliás, muitas "igrejas" o condenam, porque não sobraria grana para as próprias "igrejas", claro). É essa não imunidade que também se lhes afeta o bom e velho amor, que não é construído, receitado como um remédio, mas vivido e sentido espontaneamente.
Amar nunca foi tarefa das mais fáceis e simples, requer uma série de estruturas personalistas e combinantes entre os “contratantes”, como empatia, desejo, satisfação, visualização de algum interesse, paridade de valores, compreensão, entendimento de finalidades, simetria de almas (essa é boa) etc. A mera “recomendação” esperancística e baseada num bom-mocismo psicossocial de se amar o próximo, sob contextura religiosa, sempre apareceu para estudiosos como uma grande e deslavada mentira, utilizada malandramente como amálgama para manutenção de um rebanho de mentes sabidamente domesticados, afinal estas não contestam, não questionam, não reagem, mas principalmente não abandonam, continuam pagando a mensalidade da vida eterna. Vive-se a maior guerra ou conflito armado e o Papa pregando amor. Habermas pergunta “onde estava Deus em Auschwitz?”
Talvez se possa trabalhar conceitualmente entre a diferença do amor receitado e o amor sentido. O amor receitado, como uma receita médica, se não é autoritariamente posto como óleo lubrificante para relações amansadas, será a ligadura para quietar pela culpa experimentável de não se amar. O não se amar se torna feio e será razoável que seja pecaminoso, isso numa cabeça nihilizada de crítica e adestrada em crença é a regra. O amor se torna obrigação e não desejo sincero; se torna forma a ser pregada, não a espontaneidade do conteúdo a ser sentida. O amor sentido pode nascer do simples olhar ou da comunhão entre amigos ou entre crianças, ainda que uma seja cristã e a outra muçulmana.
Se existe algo a ser investigado é o ódio rácico de algumas religiões, ou “igrejas”. Sempre muito disfarçado, encoberto num discurso politicamente correto de amor ao próximo. Mas também muito sempre pronto a ser disparado se alguém da “corrente” contrária, ou ateu, macumbeiro, agnóstico ou desavisado em geral pisar nos seus calos. Alguns discursos desses que pregam o amor vêm recheados de ameaça e autoritarismo, no sentido de que somente o amor “salva” e deve imperar, com o fator subliminar escrachado de que se o outro não aceitar será rapidamente excluído.
Uma conclusão que parece ser razoável é a de que nós, mamíferos, ou essas unidades de carbono de que somos constituídos, não deveríamos ter a arrogância mundana de querer “saber” de Deus. Podem os historiadores nos dar, e dão, o que sabem de Buda, 500 anos antes de Jesus, por exemplo, esses dois aí e outros iguais que viveram aos seus tempos. Nós, primatas melhorados, podemos no máximo “imaginar” ou “supor” sobre a figura de Deus, mais que isso será arrogância nossa. Mas não adianta, somos metidos, só porque construímos pontes e mandamos uma meia de sujeitos à Lua nos entregamos à “achologia”, ao “achismo”, somos “achólogos”, achamos coisas e falamos com a arrogância dos boçais. Já do amor, podemos falar, cada qual da sua experiência. Amar é bom demais. Aí sim podemos ter conhecimento de causa. Viva o amor e as mulheres bonitas (e todas são bonitas). Texto ainda sem revisão. Jean Menezes de Aguiar.
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