Caio Prado Jr. foi um
historiador, autor de o que se pode chamar um dos 3 livros mais importantes do Brasil na área, intitulado Formação do Brasil contemporâneo, datado de
1942.
Concedeu uma entrevista em 1967, no auge da ditadura militar para um
grupo de estudantes do grêmio da Faculdade de Filosofia da Usp. A entrevista
está relatada na magnífica obra do jornalista Elio Gaspari, A ditadura escancarada, ps.
229-230.
O renomado historiador que
ficou 545 dias na prisão para somente depois disso ser absolvido pelo Supremo,
já com 64 anos de idade foi acionado criminalmente pelo Ministério Público que
se indignou com uma frase da entrevista. Duas passagens dessa entrevista
merecem releitura na atualidade.
A primeira é a que Caio
Prado responde, sobre o movimento estudantil poder manejar a revolução
socialista. Diz o intelectual "Não acredito que os estudantes sejam os
possíveis líderes da revolução, mas acho que têm condições de estimularem o
proletariado urbano e rural para que iniciem sua luta. Agora, como
guerrilheiros, não acredito."
Depois afirma: "Mesmo
a luta armada tem uma porção de graus: vai desde o choque de rua até a guerra
civil."
A segunda resposta, a que
melindrou o MP a acioná-lo criminalmente é sobre que solução haveria para a
situação. O famoso intelectual dispara: "Não devemos discutir a forma de
luta, e sim começar a lutar...".
Em uma semana vemos a
cúpula de 2 dos Poderes enrolada com passagens aéreas oficiais em aviões da
Força Aérea, para familiares, noras, genros e amigas assistirem partida de
futebol. Na mesma semana o olímpico Tribunal de Contas distribui 1 milhão de
auxílio-comida a suas "autoridades" (e não só o Tcu, que fique bem
claro). Isso não cessa e não vai cessar.
"O Brasil está matando
o Brasil", fala a música do gênio Aldir Blanc, cantada acidamente por uma
Elis inigualável. Mas essa matança dura 50 anos. Não é de agora. E esse povo
não faz nada, apenas reclama, baixinho e educadamente, na fila do supermercado.
Estudar a luta armada no
Brasil é um mero recorte histórico. Triste e cheio de agonia. Crédulos e operacionalmente
maltrapilhos tentaram a revolução. No auge, havia mais militantes presos do que
soltos, e estamos falando de 500 pessoas. Isso quando se cantava "90
milhões em ação...". Hoje a população é de 200.
Essa elite política (que
mata o Brasil há 50 anos) ri das "ruas". Zomba dos movimentos atuais.
Seus salários de 40, 50 mil reais são vitalícios. Suas pensões, nos mesmos
valores, transmitem-se a herdeiros, filhas etc. Essa elite desse sistema jurídico brasileiro
aposta todas as fichas que daqui a 2 ou 3 meses "zerou"; as ruas
serão uma referência histórica. Ou uma lembrança de um "Inverno brasileiro
de 2013". Essa elite tem estudiosos a seu prol que lhes dá pelo menos
informação histórica.
Se a luta armada foi massacrada, se a "guerrilha"
do Araguaia foi massacrada, bastou o Governo querer, os movimentos das ruas
podem ser. Para essa elite, há um "incomodozinho" maior na atualidade chamada Internet.
O que se viu nas ruas,
agora há pouco, foi um cânone de revolução. Um cântico de sonho. Uma forma de
revolta. Talvez, pessoas que assistiram aos 500 da luta armada do Golpe de 64 e
lá, nos seus respeitosos e amedrontados silêncios, torciam para que aqueles
garotos com nomes falsos vencessem, mas eram massacrados um a um por um Estado
desde aquela época desonesto e infame, tenham chegado às lágrimas agora, de emoção, vendo
um povo tatear a resistência. Experimentar a revolta coletiva. "Começar a
lutar" como ensina Caio Prado, ou querer ser um "guerrilheiro",
palavra que assusta a tantos que foram educados a temer o Estado.
Estudiosos e sonhadores do
Brasil, artistas e poetas dos sonhos de uma país bom para todos, estão chegando ao seu tempo sem ver o Brasil
melhorar. Foi assim com Florestan, Darcy, Paulo Francis, Milton Santos, Millôr, Celso Furtado e tantos outros.
Antigamente havia a força. Hoje há o cinismo. Pela força os
resistentes eram abatidos. Pelo cinismo os menos favorecidos são vitimados pelo
degredo social da falta de assistência a uma vida digna. Às vezes fica difícil saber
qual é o pior.
As manifestações de rua
podem quebrar a letargia do sono drogado, um sono que escondia o sonho e a
felicidade. Mas poderia parecer infame falar que alguém que passa necessidade
consiga dormir esse sono histórico. Essa pessoa apenas se ajeita. Como se insistisse no direito de
viver, num país em que o Estado se blinda, se ultrarremunera e se transforma com
a certeza de décadas de impunidade oficial a si. Tudo contra o povo pacato,
trabalhador e historicamente enfraquecido. Jean Menezes de Aguiar.
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