sábado, 9 de março de 2013

NY: consumismo x funcionalidade

Fev 2013, Nikon D3200, 24mp, objetiva Nikkor 55-300mm, puxada nos 300mm. JMA.


Artigo publicado no jornal O DIA, fev. 2013


            Em épocas de globalização, em pleno 2013, não estou tendo onde ou como escrever esta matéria de hoje. Não sei se conseguirei enviar para o jornal. Isso porque me encontro em Nova Iorque, um dos centros de maior tecnologia do mundo. O incômodo gráfico, textual e consequencial é enorme.

            O assunto teria como objeto uma discussão sobre o consumismo, mas o entrave que se me apresenta é imenso. Comprei um notebook aqui para substituir o velho e poderoso Philco, isso mesmo, um montado na China como qualquer um. O novo, bem bonito, vem com o Window 8 que mais parece um joguinho de descoberta de como se maneja algo capcioso criado somente para dificultar e manter a reserva de mercado de que somente "eles" podem saber como fazer. Sem problema.

            Aí pensei, fácil, estou num hotel na 7a avenida, em frente ao Madison Square Guarden, um estabelecimento com mais de mil quartos e que para eu chegar do elevador ao apartamento preciso de exatos 150 passos. Deve haver uma "salinha" de internet.

            Bingo, como dizem os americanos. Para um hotel deste tamanho há uma sala com 5 computadores. Não posso estranhar, a presunção é de que todos tenham o seu computador, menos alguns como eu que estejam "em transição".

            Vou à recepção e me cobram 20 dólares por uma hora de uso. Sinto-me razoavelmente assaltado. Não é aqui que tudo é praticamente de graça? Ledo engano, algumas coisas são exorbitantemente caras. Enfio o cartão e o troço começa a funcionar, ok. Procuro o Word, sim aquele programa para digitar (não é este que estou usando, este é apenas o WordPad - e, de novo, não sei se conseguirei enviar esta matéria - tomara!). Não há Word.

            Controlo o desespero. O que vale um computador para mim sem Word? Nada. Joguinhos? Cruz credo, já sou deliciosamente idoso e desalegre para curtir joguinhos (amigos do Facebook, parem de me convidar para não-sei-o-que-Ville).

            Consigo "ligar" um editor de texto no computador do hotel, mas o teclado não funciona, ele não sabe que existe o Brasil. Não há um acento gráfico em português. Vou ao meu Blog e copio um artigo meu publicado. Tiro todos os acentos e sinais, os copio no arquivo do novo texto e começo a escrever copiando e colando cada um dos sinais quando preciso, um a um. Mas aí olho para o consumo miserável do "card" da internet e ele já comeu quase 50% dos 20 dólares. Bate o desespero. Estando na terceira linha com este método infernal, precisarei de uns quatro mil dólares para mandar esta matéria. Sem chanche. Aborto.

            Subo para o apartamento e peço à namorada, novinha, sabe tudo de internet, que tente por o novo notebook em português. Ela diz que não pode perder o dia da Macy's para tentar me ajudar (e sou eu que quero correr para lá). Imploro e ela perde toda a manhã. Estava certa, o Windows 8 foi feito para garotos viciados em computador, mas tudo bem. Acesso a internet e pergunto ao Gúgle (pense com sotaque maranhense, ouvi assim lá, é poético) como transformar o Windows em português. Vem um garoto com uns 8 anos de idade que não é brasileiro, ouvindo-se um martelar de obra ao fundo e ensina, no Youtube. Eu amo esse garoto desconhecido. Consigo pôr o teclado em brazuca. (Tomara que consiga "enviar", não tenho e-mail instalado ainda).

            Aí estou aqui, digitando a matéria de hoje. Qual é mesmo o tema? Xi, já comi quase todo o tamanho da matéria contando esse besteirol. Tudo bem, confio que serei perdoado, afinal estou invocando o provincianismo de dizer que estou em NY. E foi a minha primeira vez (não doeu).

            O tema seria sobre uma leitura do consumismo. Confesso que me surpreendi. Estamos acostumados a uma interpretação vulgar do consumismo na visão da compra, o verbo consumir em si, a coisa do shopping center, a pessoa cheia de sacolas. Por aqui há muito mais que isso e os sacoleiros não são os novaiorquinos. Até porque os deslumbrados com muamba somos nós, não eles.

            Eles podem viver o espírito do consumismo, nós vivemos sua mundanidade. O consumismo para eles aparece num atendimento ruim, sempre apressado e mal humorado. Não gostam de dar informações. Se não der gorgeta o cara lhe cobra acintosamente. Eles acham que têm "direito" a gorgeta. Há essas "bobagens" nas relações com eles. Mas há coisas densas que precisam ser analisadas.

            Não se vive aqui o luxo paulista fútil de os restaurantes terem que fazer reforma todo ano porque se não o cliente "enjoa". A louça sanitária nos banheiros se funcionar perfeitamente pode ser da época do pós-Guerra. Os aquecedores para calefação também. A impressão é que os enfeites da coisa nova não precisam existir se a funcionalidade estiver cumprindo seu papel. Isso é cultura.

            O metrô tem uma cara que parece imutável, não é mexida, não é reformada a cada prefeito com novos tijolos que custarão bilhões de dólares como as calçadas paulistas, tudo feito para piorar e quebrar, precisando de reformas e com chances a comissões milionárias que o Ministério Público jura que vai investigar e nunca dá em nada.

            A funcionalidade americana é desconsumista e desnatura o seu consumismo. Isso é muito bom de se ver. Haveria um consumismo, sim, com suas garras afiadas, mas sem tomar o espaço de um clássico que os países que apenas "imitam" querem desovar em troca do "tudo novinho", o horror cafona da decoração toda novinha sem nenhum peso.

            Estou sem o contador de palavras e aqui não consigo visualizar o tamanho do artigo. Vou aprofundar o tema dessa visão comparatória que achei fascinante. Anotei diversas características em observações que tenho feito no frio de até 8 graus negativos. Ainda fico algum tempo aqui. Espero que a matéria de hoje chegue sem grandes erros, cuja responsabilidade é somente minha pessoal. Agora, a Macy's me espera. Jean Menezes de Aguiar.

 
PS. Por presente do destino encontrei Leny Andrade, citada no artigo abaixo, na BH fazendo compras. Foi um papo amoroso com essa grande cantora brasileira.

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