Artigo publicado no Jornal O DIA SP em 28.6.12
Aparecer na Tv é uma festa; amigos
telefonam dizendo que a pessoa “virou artista”; parece ser um título que agrada
a todos. Pular amarelinha as criancinhas gostam; brincadeiras alegram o coração
e divertem a mente. A Cpi essa aí, feita de água, seria um misto de vaidade e
brincadeira? Se for, não era para ser. O fato é que sob a desculpa de que
precisavam dar “uma resposta à sociedade” (que altruísmo), políticos não se aguentaram
e criaram uma Cpi. Não se bastaram em tão-somente assistir ao trabalho
profissional e obrigatório do Dpf - departamento de polícia federal-, que
coletou as provas.
Investigação é uma área de
conhecimento técnico que requer estudo, prática, livros e cursos. Negociação é
outra. Mas qual é a “formação” dos C-p-izeiros em investigação e negociação?
Esse questionamento poderia ser primário se visasse a uma reserva de mercado
para profissionais de investigação e negociação. Mas poderá ser angustiante
para o povo que paga o reality show de uma Cpi que talvez não produza nada
de novo em termos de provas concretas.
Nem se diga que político é um “negociador
por excelência”. Essa pode ser uma piada perversa num país em que o conceito de
política recepciona, ordinariamente, coisas como “é dando que se recebe”, “rouba
mas faz”, “estupra mas não mata”, “nepotismo cruzado” e a última moda oficial: o
bom e velho “eu não sabia”, além de tanta outras noções similares que norteiam
as cabeças de quase todos os políticos brasileiros. Negociar é outra coisa. A
Cpi poderia até ter “optado” por uma negociação técnica com envolvidos e
testemunhas, se não fosse alguma ingenuidade de seu menino-relator e um
vedetismo-bravata barulhento de alguns ali.
A mania de querer ser
investigador anda assolando “autoridades”. Promotores estão lutando para ganhar
a carteirinha; o STF dirá se podem ter ou não. Políticos ficam sabendo de uma
investigação do departamento de polícia e abrem Cpi para investigar. Por seu
turno, a imprensa faz o seu papel, distribui fama na Tv a preço de liquidação. O
Brasil conseguiu imitar bem os americanos: escândalos públicos viram um
lucrativo show televisivo.
O poderoso Jornal do Brasil em
seu site (26.6.12) registra, sobre a testemunha Écio Ribeiro: “O ministro do STF Cezar
Peluso concedeu a Ribeiro o direito de se fazer acompanhar de advogado e de não
ser preso em decorrência da invocação do direito constitucional de não
autoincriminar-se, com a prerrogativa de permanecer em silêncio”. Há um
festival de erros aí. Não é o STF que concede o direito de alguém ser
acompanhado de advogado, nem que garante o silêncio. É a lei. As históricas
ameaças e tentativas de prisão feitas pelas Cpis são simplesmente ilegais,
retratando total falta de conhecimento de políticos que se veem juízes, a ponto
de se precisar do óbvio: habeas corpus para não se sofrer arbítrio
dessas “autoridades”.
Esse
amadorismo nos conceitos jurídicos não deveria imperar. Odair Cunha, relator da
CPI, dizem que passou a perseguir o governador de Goiás, além de não saber
muito bem o que pergunta na investigação televisiva. O Dpf já ofereceu um
“cursinho” a ele que anda confundindo as qualidades de depoente, testemunha e
acusado. Aí, como a imprensa é imperdoável, ao mesmo momento que projeta o
sujeito em fama, lanceta o erro na lama.
Nem
a Cpi vem sendo uma sede policial estrita (similar que fosse), em termos de
investigação, manejando contradições a seu prol e complicando pessoas
potencialmente envolvidas; nem um ambiente técnico de negociação profissional,
obtendo acordos geniais, o que poderia até ser interessante, se alcançasse compromissos,
estimulasse delações, instigasse novas ideias e caminhos e efetivamente
obtivesse novas provas e luzes. Agora cismou de conversar com a sra. Cachoeira,
a bela, que parte da imprensa em franca discriminação resolveu chamar de “namorada”.
Que feio.
Políticos
podem ser, legitimamente, padeiros, empresários, banqueiros, índios, Ph.Ds.,
químicos, donas de casa, curiosos, delegados encostados ou efetivamente
qualquer um. Basta conseguir muitos milhões de reais para uma campanha política
a um cargo cujo salário jamais cobrirá os tais milhões conseguidos, numa lógica
que a Receita nunca quis saber. Nesse quadro, o “I” da Cpi será o que menos
importará. Basta estar político para aparecer na Cpi.
Há quem acredite na pureza
institucional das instâncias, das sedes, dos órgãos, das comissões, das funções
e das atuações públicos. Mas historiadores e intelectuais seniores do país veem
uma certa escatologia em muito disso aí. O grande antropólogo Roberto da Matta teoriza
que a corrupção existe há séculos no Brasil, o que vicia irremediavelmente
instituições e cargos. Parece ficar patente o baixo benefício que a Cpi consegue
em relação a seu custo. Ainda, quando a Cpi virou a menina dos olhos de oposições
(da esquerda e da direita), para ameaçar e contundir governos e inimigos, perdeu
completamente a credibilidade.
Ou seja, não é mais a verdade
que importa, mas a desestabilização política ou desmoralização do oponente. Isso
não é investigar seriamente.
A Cpi poderá até conseguir
alguma coisa, mas as provas já estão prontas. Perde-se objetividade, foco e
possibilidade de bons resultados quando se trabalha politicamente. Perde-se
técnica quando se trabalha por leigos em investigação e negociação. E quem paga a conta da festa é o povo. Pena
que ele goste de ser mais expectador do que fiscal do próprio dinheiro. Jean Menezes de Aguiar.
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